AGRONEGÓCIO OCUPA TERRAS INDÍGENAS DE RONDÔNIA

                                 

Entre promessas fundamentais e a realidade decepcionante, os povos indígenas são constantemente lembrados de que a distância entre o discurso político e a ação efetiva pode ser mais vasta do que a destruição progressiva de suas terras. Inicialmente, a posse do presidente Lula em 2023 trouxe esperança, pois seria o rompimento da perspectiva genocida do governo anterior. Contudo, as ações concretas para garantir os direitos fundamentais à terra e a políticas públicas diferenciadas ainda não se materializaram. Ao longo do primeiro ano do governo Lula III, as expectativas dos movimentos indígena, indigenista e de outros setores da sociedade que acompanham a causa no país foram confrontados com uma realidade frustrada. Por um lado, o governo expressa interesse em manter um discurso positivo, em sintonia com as aspirações e esperanças das comunidades indígenas. Por outro, as práticas cotidianas revelam uma abordagem que, ao contrário da retórica, tende a ser morosa e a instrumentalizar os direitos dos povos indígenas como barganha política com setores que tradicionalmente se posicionam contra as causas ambiental e indígena. A criação do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), comandado por Sônia Guajajara; as mudanças no órgão indigenista, que passou a se chamar Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), e que foi assumido por Joenia Wapichana; e a escolha do também indígena Weibe Tapeba, do povo Tapeba, do estado do Ceará, para a Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), simbolizavam o andamento do compromisso assumido com as comunidades originárias. No entanto, faz-se necessário muito mais que nomeações de representantes indígenas para cargos-chave em órgãos precarizados, sem recursos e com suas atribuições retiradas. Para a execução de medidas efetivas é preciso ultrapassar a pressão de setores contrários aos direitos territoriais indígenas. Esperava-se a implementação de um plano abrangente para demarcação de terras e adoção de políticas públicas que garantissem a segurança das comunidades, promovendo assistência em saúde e educação, além de combater a fome, a violência e as invasões territoriais. Era aguardado, ainda, a revogação imediata de medidas administrativas do governo anterior que inviabilizam a garantia dos direitos indígenas. Mas os povos indígenas perceberam, no dia a dia, que seus problemas não retrocederam, pelo contrário.

A demora na demarcação de terras e a persistência da violência e das invasões territoriais evidenciam diariamente os mesmos desafios enfrentados há décadas. O governo federal não deu conta das demandas e não adotou medidas estruturais significativas. Não houve iniciativas no sentido da reflexão, elaboração e execução de políticas públicas específicas e distintas destinadas a apoiar e promover as comunidades indígenas no Brasil, assegurando-lhes o direito exclusivo ao usufruto das terras, com foco na produção de alimentos e na garantia de renda às famílias indígenas em seus territórios. Não foram implementadas mudanças eficazes para enfrentar as violações de direitos e garantir o acesso aos serviços básicos. Além disso, para complicar ainda mais a situação já precária, o governo optou por regulamentar a Agência Brasileira de Apoio à Gestão do SUS (AGSUS), conferindo-lhe a responsabilidade pela gestão da política de saúde e abrindo caminho para a privatização da saúde indígena no Brasil. Sem falar que o debate sobre a gestão da educação escolar indígena, a partir do Ministério da Educação, simplesmente não existiu. No cenário legislativo, a pressão das bancadas do agronegócio e do ruralismo comprometeu ainda mais os avanços na demarcação de terras e na proteção dos direitos indígenas. A rejeição dos vetos presidenciais e a efetivação da tese do marco temporal através da Lei 14.701/2023 representou um revés significativo para as comunidades indígenas. Agora, competirá às organizações indígenas e aos defensores dos direitos originários a incumbência de pleitear a invalidação da lei por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal. Diante desses desafios, os povos indígenas, suas organizações e apoiadores perceberam a necessidade de uma luta articulada com outros setores da sociedade para garantir seus direitos perante os poderes públicos. É essencial que o governo assuma um compromisso real com a defesa dos direitos indígenas, superando interesses políticos e econômicos contrários à sua proteção. Em suma, o primeiro ano da política indigenista do governo Lula apresentou pouquíssimos avanços, alguns simbólicos, mas sem surtir efeito contra os enfrentamentos significativos, que exigem uma resposta mais robusta e eficaz por parte das autoridades. A garantia dos direitos territoriais, a proteção contra invasões e violências e o acesso a serviços básicos devem ser prioridades inegociáveis em qualquer agenda governamental que se pretenda justa e inclusiva.


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